Copom, do Banco Central, decidiu subir a taxa básica de juros para 11,75% ao mês
Adriano Machado/Reuters - 02.09.2020A guerra no Leste Europeu e os novos surtos de Covid-19 na China devem prolongar a inflação no Brasil e no mundo. Assim, a renda fixa — em especial os títulos pós-fixados atrelados ao CDI, Selic e IPCA — continuará a ter o seu destaque ao longo do ano, principalmente para os investidores que não querem ver grandes oscilações patrimoniais.
“A pressão inflacionária está atingindo principalmente os produtos que têm o petróleo como matéria-prima e também insumos e commodities que são exportados para a Rússia e para a Ucrânia. Além disso, o governo chinês colocou algumas cidades em lockdown por surtos pontuais de Covid, e isso pode causar interrupções nas linhas de produção e na oferta de determinados produtos”, explicou Rodrigo Beresca, analista de Soluções Financeiras da Ativa Investimentos.
Soma-se a isso o fato de que o ano eleitoral no país pode estimular medidas populistas por parte do governo, com impactos negativos para as contas públicas.
Nesta quarta-feira (16), o Copom elevou a taxa básica de juro em 1 ponto percentual, deixando a Selic em 11,75% ao ano. A expectativa de inflação para este ano disparou para 6,45% no Boletim Focus mais recente, muito acima do teto da meta, de 5%.
Nos cálculos do professor de Finanças da FGV-SP Fabio Gallo, a poupança é o único investimento de renda fixa que não deve ter ganhos que batam a inflação. Ele considerou um aporte de R$ 1 mil a ser sacado daqui a um ano.
"Quando fazemos as recomendações de renda fixa, olhamos não só o hoje, mas também o futuro. Nós temos essa tendência de alta da taxa básica de juros e por isso é interessante ter uma parcela da carteira em pós-fixados atrelados ao CDI e à Selic, porque esses ativos vão acompanhar o movimento de alta da taxa de juros. E são os ativos mais conservadores, que oscilam menos", explica Camilla Dolle, head de renda fixa da XP. Esses títulos são recomendados para objetivos de curto prazo.
Na Ativa Investimentos, a aposta é de que a Selic vai atingir o seu pico em junho, aos 13,25% ao ano, e permanecer assim em 2022. A queda gradual deve começar a acontecer somente a partir do ano que vem.
Os investidores com objetivos de médio e longo prazo podem fazer aportes em títulos atrelados à inflação, recomenda Rob Correa, analista de investimentos CNPI.
Já os títulos prefixados são mais arriscados. Isso porque, explicou Vinicius Romano, especialista em renda fixa na Suno Research, a rentabilidade desse título fica “travada” na hora do aporte. Se a Selic subir, esse investimento pode ficar desvalorizado; se a Selic cair, aí já há possibilidade de ganho — mas não é esse cenário que se delineia no momento.
O analista de investimentos da Nova Futura Investimentos, Matheus Jaconeli, vê possibilidade de ganhos no setor bancário, de saúde e em empresas com poucas dívidas.
“Alguns bancos ainda estão descontados [com ações mais baratas do que elas realmente valem]. O setor de saúde também, e agora, com os protocolos sendo flexibilizados, as pessoas devem voltar a fazer mais exames e cirurgias.”
O minério de ferro também pode ser uma boa aposta, na opinião dele. “No segundo semestre, teremos a reunião do Partido Comunista Chinês, e o governo vai querer entregar um crescimento interessante para o país. Então, se tivermos a redução dos casos de Covid por lá, o setor de minério pode ser também uma aposta”, disse Jaconeli.
Na outra ponta, empresas de consumo cíclico devem sofrer, pois parte do orçamento fica comprometida com inflação, e as pessoas postergam esse tipo de gasto para poder comprar o que é essencial.
Apesar de nos últimos dias o dólar ter tido um movimento de alta, a moeda americana ainda está cotada a um preço mais baixo que no início do ano. Na opinião de Jaconeli, da Nova Futura, esse alívio no câmbio é momentâneo, já que, no horizonte, há a percepção de risco com o governo querendo intervir na Petrobras e ampliar o auxílio emergencial, medidas que aumentam a percepção de risco e afugentam o investidor. Ademais, o aumento de juros nos Estados Unidos torna mais atraentes os títulos americanos, considerados mais seguros.
Rodrigo Beresca, da Ativa, explica como os produtos reagem ao atual cenário econômico. E a plataforma de soluções financeiras Economatica mostra o retorno que cada índice teve em um ano, descontada a inflação, a seguir:
Poupança
Tem liquidez diária, ou seja, é possível resgatar o dinheiro a qualquer momento, e oferece risco zero para o investidor, mas também, por isso, oferece uma rentabilidade baixa, que não costuma bater nem a inflação. Se o saque for realizado antes do aniversário não haverá pagamento dos juros do mês. Em um ano, a poupança teve o retorno negativo em 4,68%.
LCI e LCA
Bons títulos por causa da isenção do IR e cobertura do Fundo Garantidor de Créditos (FGC). As letras têm lastro em ativos imobiliários e ativos agrícolas e são mais seguras que os CRIs e os CRAs, mas, por esse mesmo motivo, podem apresentar um prêmio menor. O investidor que carregar esses ativos por mais tempo pode ser beneficiado, já que a previsão é de novos aumentos para a Selic.
CRI e CRA
Estão com as taxas bem atrativas, porque costumam ser pós-fixadas. Não têm cobertura do FGC. Para não correr riscos desnecessários, deve-se olhar o emissor desses ativos. Se o ranking do emissor for alto, ele pode pagar melhor que LCI e LCA. Mas, se o emissor tiver um ranking baixo, existe a possibilidade de calote. São ativos securitizados, ou seja, possuem lastros em outros ativos. Por exemplo: se um agricultor quer fazer um financiamento para sua safra, ele contrai uma dívida emitindo um Certificado de Cédulas de Crédito Bancário (CCB) e a vende para um banco. Esse banco pode pegar várias CCBs e as vender para uma securitizadora, que, por sua vez, as “empacota” por meio do CRA e vende para o investidor final. No caso das dívidas imobiliárias, o processo é o mesmo, mas feito por meio do financiamento imobiliário com a Cédula de Crédito Imobiliário (CCI).
Debêntures incentivadas
Ótimas opções porque têm pagamentos semestrais dos cupons. São papéis de dívida emitidos por empresas, sejam elas sólidas e bem ranqueadas em agências internacionais, ou não tão bem ranqueadas. Estas últimas costumam pagar um prêmio maior por causa do risco.
CDB
Com cobertura do FGC, esse tipo de investimento é um dos instrumentos utilizados por bancos na hora de captar recursos. As melhores opções no momento são os papéis atrelados a taxas flutuantes (CDI e IPCA). Os CDBs têm uma liquidez que se assemelha à da poupança, mas com a vantagem de que é possível encontrar aplicações mais rentáveis que a caderneta no mercado. Existem bancos, por exemplo, que pagam 100% ou mais do CDI. Há também aqueles com prazos mais rígidos para resgate. Em um ano, porém, o índice do CDI teve um retorno negativo de 4,09%.
Fundos DI
Ótimas opções porque tendem a seguir o movimento da Selic, que ainda está em ciclo de alta. Esse tipo de fundo é composto de títulos privados e públicos, seu rendimento é ajustado à taxa básica ou ao CDI. São mais conservadores e têm uma liquidez diária, mas não contam com a cobertura do FGC.
Fundos imobiliários
O aumento da taxa de juros impacta o crédito imobiliário, que encarece com a Selic mais alta. Por ora, a melhor opção em fundos imobiliários são os fundos de papel, que investem em papéis de dívida imobiliária, ou seja, em fundos cuja alocação de recursos seja focada em LCI e CRI. O índice de fundos imobiliários teve queda de 13,47% no acumulado de um ano.
Fundos multimercado
Bom investimento, porque, como investem em diversas estratégias, os gestores conseguem fazer movimentações para se beneficiar conforme o cenário. Os que têm investimento em Bolsa podem não ir muito bem. Em um ano, o Ibovespa teve desempenho negativo em 14,18%. Já o Índice de Hedge Funds (IHFA), referência para a indústria de hedge funds, que se assemelham aos fundos multimercado de gestão ativa, caiu 7,29%.
Tesouro Direto
O governo federal tem basicamente duas formas de conseguir receita para seus cofres: impostos e títulos públicos. Nesse último caso, o governo vende papéis que funcionam como empréstimos ao Estado. Os títulos mais indicados dessa categoria para o atual cenário econômico são o Tesouro Selic e IPCA + (em caso de este apresentar um prêmio mais elevado). O IMA-B, índice formado por títulos públicos indexados ao IPCA, tiveram um desempenho negativo de 9,37%.
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